REPORTAGEM DA SEMANA: MERCADO DE CAPITAIS LONGE DO ALCANCE DAS PMES

REPORTAGEM DA SEMANA:  MERCADO DE CAPITAIS LONGE DO ALCANCE DAS PMES

O mercado de capitais continua distante do alcance das Pequenas e Médias Empresas (PME). Questões de modelo de negócio, ausência de contas auditadas e volume de negócio são apontados como sendo o grande entrave para que estas acedam ao mercado de capitais.

A Bolsa de Valores de Moçambique (BVM) foi criada em 1998, pelo Governo. Mas foi precisamente em 1999 que iniciou as suas actividades com o objectivo de ser uma alternativa face a outras modalidades de financiamento existente no mercado. 

A forma de o fazer é, através da captação da poupança dos investidores e canalizar para os agentes produtivos da economia, que são as empresas. Contudo, a mesma não tem sido uma alternativa de financiamento para o empresariado nacional. Porquê? 

Para Gervásio Lifaniça, consultor financeiro, o problema vem da base do funcionamento, constituição da grande maioria das empresas nacionais, que não cumpre aquilo que é o básico. 

Dados do Instituto Nacional de Estatística (2017) indicam que das 43 mil empresas inscritas, apenas 1,3% é que são constituídas como sociedades anónimas, que é um dos requisitos para aceder ao mercado de capitais. 

“Ora se tu tens apenas 1,3% de entidades inscritas como sociedade anónima, num universo de 43 mil, significa que muito poucas empresas terão acesso ao mercado de capitais”, sustenta Gervásio Lifaniça.

Os requisitos de admissão à cotação são necessários para dar uma maior confiança aos investidores sobre a empresa que está a ser cotada na Bolsa.”

Mas “o mar” de requisitos para se aceder ao mercado de capitais não termina por aí. As empresas precisam de ter contas devidamente auditadas. E mais, exige-se um volume do negócio “robusto”, (4M de meticais) algo que apenas poucas, mas mesmo muito poucas empresas estariam em condições de satisfazer. 

“As nossas pequenas e médias empresas são constituídas maioritariamente por capitais próprios ainda simbólicos”, refere. Lifaniça entende que nesses termos, essas empresas dificilmente terão acesso ao mercado de capitais. 

Salim Valá, presidente do conselho de administração da Bolsa de Valores de Moçambique, diz que os requisitos de admissão à cotação são necessários para dar uma maior confiança aos investidores sobre a empresa que está a ser cotada na Bolsa. 

Lifaniça concorda que tudo isso faz parte de boas praticas da gestão, mas alerta para a necessidade de se olhar para a realidade das nossas empresas. 

“A géneses das nossas empresas estão muito ligadas a acentos específicos do poder. Tem muito pouco a ver com aqueles princípios básicos de criação das próprias empresas. Tem muito a ver com a maturidade do nosso sistema financeiro, incluindo as empresas”, explica o consultor financeiro em entrevista à MZNews. 

Massificar a informação

Mais do que inserir-se no mercado de capitais, avança o consultor, “há que se criar condições para que essas pequenas e médias empresas entendam quais são os benefícios de ter-se uma empresa organizada”. 

Defende a criação de políticas claras de apoio às pequenas e médias empresas. No entanto, a BVM criou um Terceiro Mercado, em Novembro de 2019, para aquelas empresas que no momento de admissão à cotação não possuem a totalidade dos requisitos para serem cotadas, dando-lhes um prazo de 2 anos. 

“O terceiro mercado é uma boa janela sim, mas precisa estar consigo também uma série de campanhas de informação e formação, a essas pequenas e médias empresas, caso contrário vai ser muito difícil alcançar os objetivos pretendidos”, antevê o consultor.

As nossas pequenas e médias empresas são constituídas maioritariamente por capitais próprios ainda simbólicos”

E por tocar neste aspeto, “devo informar-lhe que a CTA tem estado a fazer encontros com empresas que visam a divulgação dos vários mecanismos de acesso ao crédito quer seja crédito tradicional através do mercado financeiro, quer seja através do mercado de capitais”, confidencia. 

Fora dos requisitos, que ao que tudo indica, estão longe do alcance do grosso das empresas nacionais, há vantagens que as pequenas e médias empresas poderiam ter caso estivessem cotadas no mercado de capitais. As estatísticas partilhadas pela BVM, indicam que as taxas médias de juros dos bancos comerciais, no último ano, andavam em cerca de 22,3% enquanto no mercado de capitais rondou cerca de 17%. 

“Em termos de custo de crédito, essa diferença representaria uma poupança”, referiu Lifaniça. E não só, o consultor explica que as empresas podem ter igualmente acesso ao capital através da entrada de novos sócios accionistas. 

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