Autoria: Jorge Zamba, jornalista e professor.
Esgotam-se as possibilidades de análises sobre o que está por vir em Moçambique. O presente conflito pós-eleitoral põe à prova a hegemonia do partido histórico – Frelimo. Já há registo de mais de 11 mortes, resultantes de confronto entre a polícia e os manifestantes. Moçambique é manchete de órgãos de comunicação internacional e a União Europeia, Organização das Nações Unidas apelam à reposição da verdade eleitoral enquanto países como China, África de Sul e Zimbabué felicitam a Frelimo e o seu candidato, Daniel Francisco Chapo, pela vitória, por sinal, contestada pela oposição.
O confronto entre os manifestantes e a polícia está a um nível alarmante que retrata, quase, um cenário de guerra onde o militar tem a incumbência de apontar para a população sem remorso. No dia 26, em Macanhelas, um dos distritos de Niassa, a polícia disparou à queima roupa os apoiantes de Venâncio Mondlane, candidato independente suportado pelo partido Podemos. Ao longo das imagens postas a circular nas redes sociais, um homem gravemente ferido arrasta-se pelo chão como uma tentativa de fuga de balas. Facto que reforça que a instrução da polícia é de impor a ordem com os canos.
Face ao caos instalado, prevalecem ainda perguntas de ordem sentimental e até analítica, embora para a última ordem seja parcialmente desafiador fazê-lo por ser moçambicano e, por isso, o risco de incorrer à objectividade, o que a ciência, principalmente, a social condena. (I) A Frelimo arriscará uma convulsão social longa a negociar com Venâncio Mondlane e o partido Podemos? A julgar pelo curso das manifestações, Venâncio Mondlane está disposto a recorrer a outras estratégias para forçar o regime a ceder. O mesmo se verifica com governo do dia. (II) Os governos de unidade nacional não são efectivos. Normalmente, servem para evitar uma guerra civil, nesse âmbito, o regime camufla um acordo com a oposição cedendo algumas pastas ministeriais. (III) A Frelimo, no caso de negociações, estaria disposta a entregar algumas pastas ministeriais mais importantes?
É preciso um meio termo para que ambas partes compreendam o impacto de uma provável guerra civil para um país como Moçambique.
Na opinião pública ou precisamente para os apoiantes de Venâncio Mondlane, a condição mãe é que a Frelimo saia do poder à favor do líder carismático, o que é pouco provável, visto que, para os partidos libertadores, entregar o poder é uma morte existencial e, igualmente, uma ameaça à soberania e estabilidade social, porque para esses regimes a oposição representa agenda de interesses estrangeiros. O último ponto, é na verdade, uma paranoia para legitimar a sua permanência no poder.
O outro ponto menos debatido, porém, relevante é como enquadrar o conflito pós-eleitoral em Moçambique e o como o regime, dependendo de como faz a leitura geopolítica em função dos seus interesses, pode discutir o acordo na perspectiva exógena. O mundo já é indubitavelmente polarizado: temos ol ocidente que tradicionalmente domina e influencia o sul global desde o jugo colonial até aos dias que correm. Surgem também países como a China e a Rússia que contrabalançam a hegemonia ocidental, principalmente, em África.
Como referi no parágrafo anterior, a Frelimo pode dar costas ao ocidente e não aceitar facilmente à pressão internacional para divulgação de editais e/ou favorecer Venâncio Mondlane nas negociações para um percentual que o permita equilibrar o poder e influenciar nas políticas públicas. Temos experiência das eleições autárquicas do ano passado, 2023, onde o governo, antes de o Conselho Constitucional anunciar os resultados, reuniu-se com o Embaixadores da União Europeia, na sua maioria, para apelar a não interferência.
Por último, Moçambique encontra-se em uma situação de caos social que extrapola os limites da vontade democrática ou a discussão sobre a transparência eleitoral. A questão fundamental é, no momento, garantir a manutenção da paz. Aqui reside a ordem sentimental mencionado no terceiro parágrafo. É preciso um meio termo para que ambas partes compreendam o impacto de uma provável guerra civil para um país como Moçambique. Com a descoberta e exploração de recurso naturais e o infortúnio generalizado da população, configuraria o país em um centro de interesses económicos: Cabo Delgado é um dos exemplos irrefutáveis.
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