“Sabemos quem és, sabemos que trabalhas com o Nini Satar”
Existem evidências dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE) e da Procuradoria-Geral da República (PGR) que apontam o cidadão moçambicano, Momade Assife “Nini” Satar como sendo o comandante de alguns dos maiores raptos com pedidos de resgate na África do Sul, de acordo com uma investigação internacional conjunta da TimesLIVE e Fundação Henry Nxumalo, verificada hoje pelo MZNews.
A publicação avança que Nini Satar confiava estes crimes aos seus melhores colaboradores, “soldados de infantaria” e colegas de prisão, cumpridores de ordens emitidas a partir do Estabelecimento Penitenciário de Máxima Segurança da Machava, vulgo “B.O.”, na província de Maputo. Entre os alegados fiéis de Nini estão Esmail Nangy, Edson Vombe e Mahomed Bakhir Ayoob. “Acredita-se que Nangy chegou a submeter-se a uma cirurgia de reconstrução facial para evitar ser apanhado, mas foi detido no início deste ano”.
A investigação, intitulada On the hunt: Exposing South Africa’s kidnapping kingpins (À caça: Expondo os chefes de rapto da África do Sul, em português), tem cinco capítulos, e procura identificar os principais promotores de raptos e assassinatos na África do Sul. O primeiro capítulo, Journalist’s killer ‘runs kidnapping empire from Maputo maximum security prison’ (Assassino de jornalista comanda império de raptos a partir da Penitenciária de Segurança Máxima de Maputo), é dedicado a relatos de crimes como tortura, extorsão, intimidações e morte, supostamente perpetrados por homens de confiança a mando de Nini Satar.
Em um dos casos, os criminosos raptaram a empresária moçambicana de uma empresa de Forex bem-sucedida, a sr.ª Gita Samgi, de 57 anos, em Outubro de 2019, na porta de sua residência, em Mbombela, na África do Sul. Ela mudou-se de Moçambique em 2017 depois de a sua irmã, Poornima Singh, ter sido raptada em Maputo. Foi solta de cativeiro após o pagamento de um resgate.
Os raptores enviavam vídeos aos familiares de Gita onde esta aparecia sendo queimada com ferro quente e pedindo por socorro. Os familiares pagaram, até Fevereiro de 2020, 130 milhões de randes (mais de 456 milhões de meticais, no câmbio actual) pelo resgate de Gita, mas em vão.
“O corpo de Gita, embrulhado em lençóis, foi encontrado debaixo de uma ponte da autoestrada N4, perto de eMalahleni, a 28 de Fevereiro de 2020. Estava morta há dias”, lê-se na publicação.
Um membro da família, que acredita ter sido raptado pelo mesmo sindicato, disse que foi afogado e quase morreu depois de o seu irmão ter enviado ao responsável pela negociação dos raptores uma mensagem que quase selou o seu destino.
“O meu irmão cometeu o erro de enviar uma sms a dizer: ‘Sabemos quem és, sabemos que trabalhas com o Nini Satar’. Eles não gostaram do facto de o meu irmão ter escrito esse nome”.
“Encheram a banheira de água. Envolveram o meu corpo com correntes. Puseram-me um saco de plástico na cabeça e atiraram-me para a banheira durante minutos até eu perder os sentidos. Depois disso, comecei a colaborar mais”, disse.
Segundo a TimesLIVE, existem provas dos familiares e amigos das vítimas, dos Serviços Policiais da África do Sul (SAPS, na abreviatura em inglês), do SISE e registos policiais internacionais “que alguns dos principais raptos com pedido de resgate na África do Sul terão sido orquestrados pelo grupo de Satar e levados a cabo pelos seus homens de maior confiança”.
“De acordo com documentos dos serviços secretos moçambicanos, é a partir da sua cela na infame prisão de segurança máxima B.O., em Maputo, que as polícias moçambicana e sul-africana acreditam que Satar tem vindo a construir, desde 2012, o seu império de raptos, que obrigou muita da elite empresarial do país a fugir para a África do Sul”, lê-se.
O advogado de Nini Satar, Mutola Escova refutou as alegações perante os investigadores, dizendo tratar-se de boatos, até porque “Satar é um empresário de sucesso. É proprietário de 40 apartamentos em Paris. É um grande homem de negócios e isso sempre causou muita inveja na sociedade”.
Os crimes de rapto na África do Sul, diz a investigação, recrudesceram com a chegada de Esmail Nangy, Edson Vombe e Mahomed Bakhir Ayoob entre 2013 e 2017. Eles iam à procura de empresários muito ricos que fugiram de Moçambique devido a ondas de assaltos nos anos anteriores. “Fonte da inteligência sul-africana diz que eles são apelidados de ‘Os Moçambicanos’”.
“Numa entrevista exclusiva ao TimesLIVE Investigations, altos funcionários do Gabinete Central de Combate ao Crime Organizado e Transnacional da Procuradoria-Geral da República de Moçambique disseram que Vombe, Nangy e Ayoob eram controlados a partir da prisão por Satar, que os usava para dirigir as suas operações”, escrevem os investigadores.
O advogado de Nini recusou as acusações.
“Estamos actualmente a investigar fortes ligações entre Satar, Nangy e Vombe, que aparentemente assumiram a gestão diária das operações de Satar na África do Sul”, disse um membro sénior do Gabinete Central de Combate ao Crime Organizado e Transnacional da PGR.
Além de informações do SISE e PGR, a TIMESLIVE disse que teve acesso a documentos da polícia moçambicana sobre as investigações a Nangy.
Em alguns crimes liderados por Nangy tiveram a participação de pessoas próximas, nomeadamente seu irmão Amade, o primo Danish Nangy e pelo menos uma das suas quatro esposas, Asserina Sadique Nangy.
O processo revela que os outros alegados cúmplices de Nangy, Celso Abílio Cossa e os irmãos Samuel Fortunato e Edgar José Fortunato Rungo, foram detidos pouco depois do empresário Ahmed Anwar, sequestrado em Maputo, ter sido libertado de cativeiro.
“Um relatório dos Serviços de Informação e Segurança do Estado moçambicano (SISE) intitulado “Raptos de moçambicanos no estrangeiro” corrobora as afirmações do membro sénior da [PGR]”, escrevem os investigadores. O documento refere que Ayoob esteve envolvido em raptos na África do Sul.
O documento do SISE alega que Ayoob “ordenou” os raptos de “moçambicanos de origem indiana fora (de Moçambique), em particular na RAS … (Ayoob é) acusado de parte dos raptos efectuados … em ligação com Nini Satar … [e] utiliza bandidos moçambicanos para efectuar os raptos de Maputo para a RAS”.
Os pagamentos dos resgastes eram efectuados para contas domiciliadas no Dubai, através do sistema Hawala e a cambistas, e outras contas de Moçambique no Dubai.
Para ler as investigações na íntegra siga clique aqui.
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