Opinião
Autor: Samir Zacarias, Pesquisador.
Introdução
O Combate ao Branqueamento de Capitais e Financiamento ao TerrorismoBC/FT impõe diversos desafios para governos em todo o mundo. Moçambique, assim como outros países, tem a necessidade de implementar estratégias e medidas eficazes para combater essas práticas ilícitas que prejudicam a economia. Para que essas medidas surtam o efeito necessário e desejado é importante que as estratégias e medidas a serem implementadas tenham em consideração a realidade do país conjugada com melhores práticas internacionais.
Moçambique foi integrado na lista de vigilância reforçada do Grupo de Acção Financeira (GAFI) em Outubro de 2022 devido às actividades ainda por desenvolver apresentadas no Relatório de Avaliação Mútuo de 2021. As razões que levaram a essa inclusão foram devidamente publicadas no seu Site oficial.
Desde então, o GAFI tem reconhecido que Moçambique desde o compromisso político assumido tem tido progressos significativos em algumas das recomendações no âmbito da melhoria e fortalecimento do seu regime de CBC/FT destacando a finalização da primeira Avaliação Nacional de Risco de BC/FT e o reforço dos seus esforços em confisco de activos.
Fazendo uma análise geral ao regime de BC/FT nos últimos anos, olhando a problemática do terrorismo na província de Cabo Delgado e os altos índices de BC no país, como constantemente tem sido apresentado nos relatórios do Instituto de Basileia , por um lado, e por outro, tendo em conta os últimos acontecimentos, verifica-se que o País está no caminho certo para ter um regime mais eficaz no combate ao Branqueamento de Capitais e financiamento ao terrorismo, no entanto, deverá enfrentar desafios nos seguintes aspectos: (1) Legislação e Regulamentação; (2) Fortalecimento das Instituições; (3) Cooperação internacional; e (4) Sensibilização Pública.
1. Legislação e Regulamentação
O quadro legal moçambicano quanto a essa temática teve como marco importante em 2013 e 2014 aquando da aprovação da lei e o respectivo regulamento, que norteando e apresentando normas, medidas e actividades a adoptar e a realizar para o combate do Branqueamento de Capitais (BC) e Financiamento ao Terrorismo (FT). Esta lei foi a primeira que de forma abrangente abordou o tema tendo em conta as 40 recomendações do GAFI. Porém estes documentos não foram devidamente acompanhados com os normativos sectoriais com excepção do sector financeiro que aprovou em 2015 o respectivo Aviso contendo as normas dedicadas a este sector.
Nos anos seguintes, o sector segurador e o sector de Jogos de Sorte e Azar aprovaram um aviso a respeito do tema, precisamente em meados de 2019 e o sector imobiliário aprovou a sua legislação em meados de 2022, praticamente 5 e 7 anos, respectivamente, após a aprovação da lei.
Neste sentido, é necessário que o governo garanta que a aprovação dos normativos ou actualizações normativas atinentes a BC/FT sejam aprovadas no timing correcto com vista a fornecer uma base legal ao regime de CBC/FT.
Igualmente, é preciso incentivar os demais reguladores de sectores (fauna bravia, pedras preciosas entre outras) que apresentam actividades de alto risco numa perspectiva de branqueamento de capitais e financiamento de terrorismo a aprovarem normativos e implementarem medidas para prevenir essa tipologia de crimes.
Os países mais desenvolvidos que já contam com regimes de CBC/FT mais robustos e economias mais digitalizadas contribuem maioritariamente para as recomendações essenciais do GAFI, que é a fonte para todas as legislações ao redor do mundo. Este facto apresenta um desafio aos países em desenvolvimento com uma enorme economia informal e que tem em desenvolvimento estratégias de inclusão financeira. A legislação atinente ao CBC/FT não deve criar exclusão ou retardar os esforços da estratégia de inclusão financeira. O regulamento é claro quanto os requisitos para abertura de conta para uso actividades comerciais, que estão devidamente alinhados com as recomendações do GAFI, por outro lado temos uma economia extremamente informal, onde existem vendedores ambulantes, comerciantes nas redes sociais, biscateiros, mukheristas e.t.c, maior parte sem a documentação necessária para abertura de uma conta empresarial por exemplo Certidão comercial. Estes indivíduos acabam sempre usando uma conta individual para fins comerciais, deixando assim de contribuir fiscalmente e inconscientemente efectuando a fuga ao fisco. A legislação deve procurar abarcar esse sector uma vez que esse grupo movimenta muita soma de dinheiro como também são responsáveis pela contínua circulação de valores fora do sistema financeiro que é um enorme risco de BC/FT.
Por assim dizer, os normativos atinentes ao CBC/FT não devem ser motivo de exclusão, devem ter em conta as realidades sociais e económicas nacionais com vista a abarcar todos sectores económicos e garantir maior inserção do dinheiro no sistema financeiro formal.
2. Fortalecimento das Instituições Nacionais (de Supervisão e de Fiscalização)
O combate a BC/FT requer a intervenção de diversas instituições, desde as entidades reguladoras, de supervisão, fiscalização, entidades obrigadas entre outras. Estas entidades devem ser devidamente fortalecidas, capacitadas e dotadas de capital humano e técnico capaz para implementar e fazer cumprir as normas do combate BC/FT.
Este aspecto foi um dos vincados no relatório de avaliação mútua, com também foi reforçado no compromisso político assumido pelo Governo moçambicano onde se espera que:
a) Se realize formação para todas as entidades em matéria de auxílio judiciário mútuo, a fim de reforçar a recolha de provas ou a apreensão/confisco de produtos do crime;
b) Se disponibilize recursos financeiros e humanos adequados às autoridades de supervisão, desenvolvendo e aplicando um plano de supervisão baseado no risco;
c) Se forneça recursos adequados às autoridades para iniciar a recolha de informações adequadas, exactas e actualizadas sobre os beneficiários efectivos das pessoas colectivas;
d) Se aumente os recursos humanos da Unidade de Inteligência Financeira (UIF).
O Governo Moçambicano tem demonstrado vontade de fortalecer o combate ao BC/FT e todos os possíveis crimes precedentes. Esta afirmação deve-se à recente criação do GCCCOT em 2022, dedicada ao combate da criminalidade organizada, as constantes formações em matérias de BC/FT ao SERNIC e aos Magistrados do Ministério Público. Este entendimento foi partilhado pela Procuradoria-Geral da República.
Os esforços a serem desenvolvidos no âmbito de CBC/FT tem a sua coordenação e centralidade na unidade de inteligência financeira (UIF) que é o Gabinete de Informação Financeira de Moçambique (GIFIM), com finalidade de prevenir e combater a utilização do sistema financeiro nacional e outros sectores da actividade económica, para o branqueamento de capitais, financiamento do terrorismo e outros crimes conexos.
Recentemente houve alteração de liderança da entidade, que analisando positivamente pode significar um refrescamento e início de uma nova era, tendo em conta que a direcção anterior desempenhou um trabalho de excelência no que tange a implementação de bases sólidas para um eficiente combate a BC/FT e um óptimo funcionamento da UIF. A recente empossada direcção tem a missão de retirar o país na famigerada “Lista cinzenta” como fortalecer e implementar medidas para os restantes sectores.
Pelo facto do combate ao BC/FT ser multisectorial o Governo Moçambicano pela UIF tem o dever de potencializar e fortalecer as demais entidades para que essas possam contribuir para o combate ao BC/FT. Não se limitando, as entidades prioritárias são as entidades reguladoras dos sectores de Alto risco que actualmente não tem um programa devidamente estabelecido tais como: Inspecção-geral de Jogos, o GIFIM como sendo o Regulador do sector imobiliário entre outros.
Por estas linhas, é necessário firmar parcerias com as entidades reguladoras nacionais (ex: Banco de Moçambique) com vista à transferência de conhecimento e experiência.
É necessário, igualmente, que se invista na construção de conhecimento local na matéria de combate a BC/FT em parceria com universidades e especialistas locais com objectivo de incorporar realidades locais e ajustar as recomendações internacionais.
3. Cooperação Internacional
O BC/FT é um crime transnacional podendo ser regional, intercontinental ou mesmo internacional. Para combater o BC/FT de forma eficaz, como anteriormente citado, o Governo de Moçambique deve estabelecer uma legislação abrangente que criminalize essas práticas. É importante que essas leis estejam em conformidade com os padrões internacionais, como as recomendações do Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI). Além disso, o Governo deve garantir a aplicação efectiva dessas leis, alocando recursos adequados para investigação e punição dos infractores.
A cooperação internacional desempenha um papel fundamental neste combate, o Governo moçambicano deve fortalecer as suas relações com outros países e organismos internacionais, promovendo o intercâmbio de informações e a colaboração em investigações conjuntas. A troca de informações também deve ser aprimorada, não se limitando, por meio da adesão a tratados e acordos internacionais relevantes, como a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional como também a acordos bilaterais.
Neste contexto, é necessário firmar parcerias com as entidades internacionais, assim como, com outros governos (da região preferencialmente devido à semelhança dos mercados) com vista à troca de conhecimento, experiência e informações de forma célere, eficiente e eficaz.
Esta temática deve fazer parte da lista prioritária dos interesses da jornada diplomática do Estado.
4. Sensibilização Pública
Por fim, a sensibilização pública é um componente fundamental no combate ao BC/FT. Os intervenientes últimos do combate ao BC/FT são os indivíduos que realizam actividades económicas, realizam transacções financeiras e são os mais habilitados a identificar e reportar os casos existentes de BC/FT que ocorrem no dia-a-dia. A legislação aprovada deve garantir que seja mandatário, a formação dos funcionários de todos os sectores de alto risco em uma base contínua em matérias de combate BC/FT preferencialmente uma vez a cada 12 meses como o aplicado no sector financeiro.
As entidades responsáveis pelo controlo da legalidade, tais como, o Ministério Público, as Forças de Defesa e Segurança (Polícia da República de Moçambique), entre outras que constantemente interagem com a população devem ter o devido treinamento em combate BC/FT com vista a serem os difusores do conhecimento nas comunidades.
O Governo de Moçambique deve também investir em campanhas educativas para informar os cidadãos sobre os riscos e consequências dessas práticas ilícitas, tanto a nível como Estado Moçambicano como a nível individual para as associações de actividades económicas entre outros segmentos da sociedade. Isso pode ser feito por meio de programas escolares e a colaboração com organizações da sociedade civil.
Concluindo, o Governo deve garantir que a informação referente ao combate de BC/FT concretamente como identificar, como reportar seja difundido pela sociedade e comunidade local.
Deixe uma resposta