A Ernst & Young (E&Y) disse, hoje, em Maputo, que não cabe a si emitir um pronunciamento público sobre os escândalos financeiros das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), enquanto seu antigo auditor.
“A Ernst&Young está obrigada a deveres de sigilo e confidencialidade para com os seus clientes, portanto, não temos nada a comentar sobre o tema. A responsabilidade sobre as demonstrações financeiras é do órgão de gestão da entidade”, disse, Paulo Reis, sócio da E&Y, Responsável pelo Departamento de Seguros e Auditoria, e pelo Escritório em Moçambique.
Ele explicou, entretanto, que este posicionamento não deverá significar o encobrimento das questões embaraçosas da LAM, por se tratar de uma conduta já estabelecida para o exercício de auditorias.
“São obrigações profissionais, o sigilo profissional sobre as informações a que acedemos em qualquer auditoria, e a confidencialidade que somos obrigados a manter para com os nossos clientes assim o determinam”, frisou.
De acordo com Reis, a E&Y não mantem relações com a LAM desde 2021, ano em que deixou de auditar as contas da companhia.
“Desde então, pela questão da Lei moçambicana que determina que, afim de um certo e determinado período, o auditor tem de rodar, deixámos de ser os auditores das LAM”, referiu.
Questionado se durante o período em que a Ernst&Young não terá detectado irregularidades de ordem financeira na companhia, ele disse não ter declarações a prestar, mais ainda sobre questões despoletadas quando já deixou de haver contacto entre as entidades.
“Sinceramente, a E&Y não tem contacto com a LAM desde que deixou de ser o auditor, portanto, não tenho grandes comentários a fazer sobre isso”, disse.
Paulo Reis falava à margem de um Coffe Break corporativo sobre a necessidade de as empresas moçambicanas adoptarem, no seu sistema de gestão, práticas alinhadas aos três pilares de sustentabilidade, nomeadamente, Ambiente, Social e Governança (ESG, a sigla em inglês).
O posicionamento da E&Y segue-se à revelação de práticas desviantes da LAM detectadas pela Fly Modern Ark, empresa contratada pelo Governo para reajustar a companhia.
As leituras da Ernst&Young às contas da LAM enquanto auditor
Verdade é que se os escandândalos financeiros da LAM começam a vir a público, com maior vasão, entre 2022/23 – até se falou em privatização da LAM –, mas não significa, necessariamente, que foram cometidos nesses anos. É isto que, no entender da opinião pública, legitima a necessidade de a E&Y esclarecer, publicamente, o que se terá passado nas contas da LAM. Ou será que não detectou a ocorrência de, por exemplo, sobrefacturações e facturas “fantasmas”?
http://896.424.mywebsitetransfer.com/lam-despenha-se-em-meio-a-uma-gestao-corrupta-sobrefacturacoes-operacoes-fantasmas-e-aumento-abismal-de-salarios/
Equanto auditor das contas da LAM, a E&Y analisou os exercícios financeiros de 31 de Dezembro de 2017 a 31 de Dezembro de 2021.
No Relatório e Contas (RC) de 31 de Dezembro de 2017, publicado a 14 de Junho de 2018, a E&Y referiu que a empresa apresentava um capital próprio negativo superior a três mil milhões e meio de meticais, resultante de perdas acumuladas acima de nove mil milhões de meticais, com responsabilidades correntes acima dos activos correntes em mais de seis mil milhões e meio de meticais, e que a continuidade das suas operações estava sujeita a injecção de capital, fosse dos accionistas, banca, ou operações futuras lucrativas.
Em 29 de Julho de 2019, sobre o RC de 31 de Dezembro de 2018, mantiveram-se as observações anteriores. O capital próprio negativo era de 7.871.737.483 meticais, resultante de perdas acumuladas no montante de 12.020.019.670 meticais, e as suas responsabilidades correntes excediam os activos correntes, no montante de 8.116.759.948 meticais.
No RC publicado em 28 de Julho de 2020, sobre as demonstrações financeiras de 31 de Dezembro de 2019, a LAM apresentou, novamente, capitais próprios negativos, e um passivo corrente superior ao activo corrente. No documento, o auditor queixou-se de não ter obtido evidências suficientes que o permitissesm a fazer determinadas conclusões. E, mais uma vez, a capacidade de continuidade normal das operações da LAM foi colocada em causa.
Em 13 de Outubro de 2021, a E&Y publicou o RC referente a 31 de Dezembro de 2020, no qual referiu, novamente a exiguidade de evidência para emitir conclusões, e incertezas sobre a continuidade das operações da LAM, estando dependente da injecção de capital.
E, por fim, no RC sobre o exercício de 31 de Dezembro de 2021, publicado em 15 de Novembro de 2022, o auditor manteve a percepção sobre as incertezas de continuidade das operações da LAM, estando, portanto, dependente de injecção de capital.
Curiosamente, a partir do ano em que a E&Y relata a fraquesa na obtenção de evidências sobre as contas, os RCs não revelam, como de praxe, os montantes dos capitais próprios negativos, das perdas acumuldas, e dos passivos correntes superiores aos activos correntes.
Além dos RC aqui destacados, no portal da LAM consta o RC de 2012, faltando os de 2013, 2014, 2015 e 2016. Um trabalho do Misa detectou esse gap.
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