Hoje é o governo que dá dores de cabeça aos médicos…

Hoje é o governo que dá dores de cabeça aos médicos…

Haverá greve geral de médicos a partir de segunda-feira, dia 5 – anunciou a Associação Médica de Moçambique. Os médicos sentem-se injustiçados e humilhados na famosa Tabela Salarial Única. Coitados dos médicos – quase todas as gripes e febres dessa tabela insuportável caíram sobre os seus ombros.

E depois surgiu o Ministro das Finanças, na TV, a ronronar que o governo, mesmo sem curso de medicina, iria fazer pequena cirurgia à tabela salarial. Até hoje nada feito e os médicos irão pendurar os estetoscópios e acompanhar o mundial de Catar em suas casas, enquanto os doentes com tuberculose, cancro, malária disputam o acesso aos quartos de finais nas camas metálicas dos hospitais.

É greve dos médicos contra as politiquices macacas do nosso governo, mas quem vai, no meio disso tudo, sofrer é o povo. Nunca vi o governo estendido nos bancos de cimento do Hospital de Mavalane com a saúde resumida a uma receita na mão, nunca vi o governo sendo expulso aos berros, como um cão, dos corredores dos hospitais pelas senhoras das limpezas.

Ontem foram os professores que abandonaram as salas de aulas – deixando os alunos com longos pontos de exclamações nas cabeças. E na segunda-feira serão os médicos que disputarão as portas dos fundos dos hospitais com caixas de medicamentos fugindo dos doentes. Na segunda-feira serão os médicos que se empilharão nos corredores dos hospitais esperando pelos cuidados intensivos do governo.

Não sei o que será das crianças que balouçam a infância nas camas das pediatrias, dos internados obesos de soro e tontos de comprimidos, das mães nas maternidades que são incapazes transformar o leite materno em soro para os seus fetos, dos doentes resumidos a ossos que apodrecem de bolor à espera da visita dos médicos nas urgências. Que será deles?

Nunca vi o governo a disputar a sopa sem sal dos hospitais onde duas rodelas de cenoura boiam como nadadores em cada prato, nunca vi o governo internado nos lençóis cheios de nódoas de José Macamo e vendo o mundo acabando-se sobre uma cabeceira metálica com um termo de chá, uma banana e um pacote de bolachas Maria. Nunca vi o governo viravoltando sem camisa e falando ao médico: “sinto pontadas aqui perto do coração, senhor doutor”.

Claro que o governo sempre promete fazer análises profundas ao salário dos médicos, mas no fim coloca uma pequena prótese de subsídios amarelados como doentes com malária. Era bom que o governo fizesse um raio-X aos pulmões do salário dos médicos.

Ontem o Presidente da República disse que os professores não deviam dar dores de cabeça ao governo; e hoje é o governo que dá dores de cabeça aos médicos. Na segunda-feira, o povo sentirá pontadas aqui perto do coração e não terá nenhum médico para ouvir essas pontadas, porque o governo nunca ouve as pontadas dos médicos aqui perto do coração.

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