Governar é pisar gente e não cães…

Governar é pisar gente e não cães…

O que não falta em Maputo são sirenes. De segundo em segundo há uma sirene que se põe gritar nas ruas da cidade. Quem nunca viu, em plena cidade, o rebanho de sirenes que é pastado por longas escoltas quando passam os superiores do país? Em cada esquina da cidade há uma sirene tal como há uma mão estendida de um sem-abrigo nas entradas das mesquitas.

Foi em 2018, na Eduardo Mondlane, que vi uma escolta passando por cima de um cão que revirava lixo de um contentor. Primeiro foi a escolta e depois foram as sirenes que desfizeram as tripas do animal. Uma senhora que vendia amendoim na mesma rua gritou bem alto: “governar é pisar gente e não cães”. E eu acho que um dia acabamos como esse cão, mas é pena que a senhora não estará para gritar em honra às nossas tripas.

Há sirenes em todos cantos da cidade; há sirene pendurada nos camiões sem água dos bombeiros, há sirene da ambulância do hospital público que evacua doentes drogados de paracetamol, há sirene da ambulância da clínica privada que cruza avenida enquanto engorda os registos da contabilidade e há sirenes com escoltas, que transportam engravatados, que nos fazem transbordar nas bermas das estradas como gelatina.

Uma cidade tão pequena e cheia de sirenes. Já me esquecia das sirenes da polícia que só rosnam para não se enterrar nos semáforos, das sirenes dos carros de reboque que vão puxando pelas caudas viaturas e das sirenes da polícia de trânsito que procuram esquinas para se esconder e fabricar refrescos.

Eu também acho que governar é pisar gente e não cães, mas mais do que governar é importante inundar a cidade de sirenes. Se pelo menos tivéssemos quatro patas, como os cães, corríamos para as bermas das estradas e, assim, deixávamos as ruas para as sirenes.

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