Especialistas alertam para “ilegalidade” de privilegiar filhos de combatentes na entrada para a Função Pública

Especialistas alertam para “ilegalidade” de privilegiar filhos de combatentes na entrada para a Função Pública

Especialistas alertam que a pretensão da ministra da Administração Estatal, Ana Comoana, de privilegiar os filhos de antigos combatentes no acesso à Função Pública é ilegal e não contribui para a reconciliação nem para a criação de um bem-estar social, pelo contrário, provoca nervosismo e violência.

O Centro de Integridade Pública (CIP) diz que poderá pedir ao Tribunal Administrativo para revogar a medida.

A polémica em torno desta questão foi despoletada nas redes sociais, depois de a ministra Ana Comoana ter solicitado à Secretária de Estado de Inhambane, no sentido de privilegiar os filhos dos antigos combatentes num concurso para acesso à Função Pública.

Para Ivan Maússe, jurista e pesquisador do Centro de Integridade Pública (CIP), citado pela VOA, esta medida é ilegal porque fere a Constituição da República, que determina que todos os moçambicanos são iguais perante a lei, quer em direitos, quer em deveres, “e se nós dissermos que temos que privilegiar um grupo em detrimento de outro, para mim estamos a discriminar”.

Medida não reconciliadora

Maússe refere que os requisitos de acesso à Função Pública são disciplinados por dois instrumentos fundamentais, o Estatuto Geral dos Funcionários do Estado e o Regulamento do Estatuto dos Funcionários do Estado.

Aquele jurista nota que nessses instrumentos normativos, “nós não encontramos nenhum artigo que se refira a privilégios que devem ser dados a um grupo em detrimento de outro, muito menos a filhos de antigos combatentes, em prejuízo de outros moçambicanos comuns”.

Contudo, existe uma Lei dos Combatentes com o respectivo regulamento, que prevê alguns privilégios, benefícios ou direitos para este grupo e seus filhos, como bolsas de estudo, assistência médica e medicamentosa e isenções fiscais, entre outros, “mas nesta lei também não encontrámos nenhuma norma que se refira a privilégios no acesso à Função Pública”.

“Então, isto significa que a pretensão da ministra não tem qualquer cobertura legal, logo, é ilegal”, enfatiza aquele jurista e investigador.

Por seu turno, o sociólogo Moisés Mabunda destaca que, para além da ilegalidade, a ministra Ana Comoana também fez uma interpretação errada da legislação porque a lei diz que o Estado deve privilegiar descendentes dos antigos combatentes mortos ou feridos e não de combatentes vivos.

Mabunda considera que “de toda a forma, os antigos combatentes têm privilégios, beneficiaram e continuam a beneficiar de uma série de privilégios que os outros dizem que nunca acabam, pelo que esta medida não é reconciliadora, não é apaziguadora e não cria concórdia nacional”.

“A atitude da ministra não cria nenhum bem-estar social, não cria nenhuma reconciliação social, pelo contrário só cria nervosismo, violência e todas as consequências que isso traz, é uma infelicidade muito grande da governante”, aquele analista político.

Recurso ao tribunal

Entretanto, o CIP, aproveitando-se da lei do direito à informação, enviou uma carta à ministra Ana Comoana a pedir uma informação por escrito sobre os contornos da sua decisão “para que ela indicasse a lei que determina que os combatentes devem ter privilégio no acesso à Função Pública”.

Ivan Maússe refere que o objectivo é tentar perceber se, efectivamente, nesse concurso público feito em Inhambane, foram enquadrados ou não filhos dos antigos combatentes.

Aquele jurista alerta que “se nós notarmos que foram integrados filhos de antigos combatentes enquanto haviam outros moçambicanos que tinham requisitos previstos no Estatuto Geral dos funcionários do Estado podemos pedir ao Tribunal Administrativo para que revogue este acto”.

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