Empregada e passeadora de cães…

Empregada e passeadora de cães…

Ela é empregada, mas de quando em quando segura na coleira para que o emprego não lhe fuja. Desce as ruas da cidade orientada pelo mijo dos cães. Quando os cães alavancam as patas para mijar nos troncos das árvores, ela levanta o olhar e inspecciona o amarelo dos mijos como uma veterinária. Os cães terminam e carimbam os mijos com focinhos como funcionários dos registos.

Segue com os cães em toda cidade. Na rua os carros buzinam para os cães e ela é apedrejada por insultos que saem das janelas dos carros e põe-se a disputar espaço no passeio com as sombras dos cães. Parece que tem um fio de lágrima desfazendo-se nos olhos, mas é apenas uma lágrima destilada pelo cheiro da cebola na cozinha antes de sair…

 

Na rua os carros buzinam para os cães e ela é apedrejada por insultos que saem das janelas dos carros

Os cães não a obedecem, por isso vão sempre em frente; quando ladram para um guarda, ela aperta mais as coleiras e cala-se; quando arrumam os molares e a língua, sem mais força para ladrar, puxam as coleiras e ela sente-se, do nada, em movimento. Uma empregada é como a terra, deve, sempre estar em movimento.

E ela também tem cães que deixou em casa, ali no Chamanculo. Um chama-me Mito e o outro Hilário. Ela cuida dos cães da patroa para dar de comer aos seus cães. Seus cães tão magrinhos, com duas coleiras de fome ao pescoço e ladram, sempre, ao fim do dia quando ela regressa: “é mamã, é mamã”. Os seus dois cães passam o dia assustando as moscas que lhes poisam a boca seca e, às vezes, fiscalizam-se com as unhas fartas de sujidade as pulgas e piolhos nos cabelos. Mito e Hilário são cães que levantam as antenas das orelhas quando ela regressa.

 

Ela cuida dos cães da patroa para dar de comer aos seus cães.

Enquanto não regressa a casa cuida dos cães limpos da patroa, arruma a casa da patroa, lava o carro do patrão, leva os filhos da patroa à sorveteria e leva os restos que os cães da patroa deixam para os seus dois cães. Quando chega em casa, depois do “é mamã, é mamã”, entulha miolos de pão nos seus cães, passa-lhes a mão sobre os pêlos e eles ladram de alegria, metem-se entre as suas pernas e lambem-se como cães.

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