A petrolífera francesa Total não deverá ter grandes problemas em suportar a paragem das operações em Cabo Delgado, no norte de Moçambique devido à diversificação dos seus projectos, grande carteira de contratos de fornecimentos e operações em bolsa.
De acordo com uma análise da agência de informação financeira Bloomberg às informações financeiras da petrolífera francesa, uma das maiores do mundo, a Total apostou na mitigação de riscos em Moçambique, mas não só, recorrendo à diversificação geográfica, partilha de projectos e à colocação de salvaguardas de ‘força maior’ nos contratos para se proteger contra eventos inesperados.
“A paragem do projecto de 20 mil milhões de euros por um período indefinido devido à escalada de violência na região é um lembrete de que muitos grandes projectos de petróleo e gás são vulneráveis a eventos geopolíticos como guerras civis, insurgências e até a desastres naturais”, escreveu a Bloomberg num artigo de análise às consequências da paragem para as contas da Total.
“A Total consegue compensar a paragem através dos projectos nos Estados Unidos da América e com transações em bolsa”, comentou o analista Ahmed Ben Salem, da consultora Oddo BHF.
A Total tem uma quota de 26,5% no projecto de gás natural liquefeito em desenvolvimento no norte do país, cuja primeira produção e exportação estava prevista para 2024, mas que ficou adiada pelo menos um ano no seguimento da declaração de ‘força maior’ por parte da petrolífera.
Em causa estão as condições de segurança na região, que para a Total impedem a continuação dos trabalhos perto de Palma, no norte do país lusófono.
A Total vendeu 38 milhões de toneladas de gás no ano passado, parcialmente recolhidas nas suas centrais espalhadas pelo mundo, e tem mais quotas noutras instalações em construção na Rússia, Nigéria e no México, estando ainda a estudar novos terminais de exportação de gás nos Estados Unidos, Sibéria e Papua Nova Guiné.
“A Total tem margem de manobra porque é a segunda maior empresa de gás natural liquefeito, e os outros projectos, como o Arctic 2 LNG são promissores”, acrescentou o director do Centro de Energia e Clima no Instituto Francês das Relações Internacionais, Marc-Antoine Eyl-Mazzega, vincando ainda que “haverá outras oportunidades que vão aparecer, como o Qatar”.
O Qatar, de resto, será o grande concorrente de Moçambique, já que este país do Médio Oriente está a apostar de forma significativa na exploração de gás, planeando aumentar a sua capacidade de produção em mais de 50% até 2027 para 126 milhões de toneladas, cimentando a sua posição como o maior produtor mundial devido à convicção de que a procura irá transferir-se do petróleo para um combustível menos poluente, como o gás.
Para Moçambique, a concorrência do Qatar não é o único problema que a suspensão das obras perto de Palma acarreta: o Governo terá também de levar em linha de conta o impacto nos contratos que a Total assinou com os compradores, nomeadamente asiáticos, que apostavam em começar a receber gás em 2024.
“O atraso do prazo pode dar uma janela de oportunidade para outros fornecedores de gás tentarem ‘entrar no jogo’ e oferecer-se para substituir os fornecimentos que Moçambique garantia aos clientes”, escreveu a Bloomberg, apontando que o projecto tinha assegurado vendas e acordos de compra com várias companhias, incluindo a Royal Dutch Shell Plc, a Tokyo Gas, a chinesa National Offshore Oil Corp e a Eletricidade de França, entre outras.
“Os compradores que pediram especificamente para o fornecimento de gás estar disponível no final de 2024 ou no início de 2025 podem estar de olho em potenciais substitutos”, concluiu a Bloomberg.
Grupos armados aterrorizam Cabo Delgado desde 2017, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico, numa onda de violência que já provocou mais de 2.500 mortes segundo o projecto de registo de conflitos ACLED e 714 000 deslocados de acordo com o Governo moçambicano.
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