A nível global e em Moçambique de forma particular, o turismo foi o sector que mais sofreu os impactos da crise causada pela Covid-19. Com a redução drástica dos casos da Covid-19 e a retoma gradual das actividades no sector, abre-se uma janela de esperança para a recuperação económica do sector que é de longe o mais afectado pela crise.
Muhammad Abdullah, presidente do Pelouro do Turismo pela Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), faz uma radiografia do momento actual do turismo, e diz que a aposta no turismo doméstico deve ser levada a sério. Não obstante esta abertura que se vem verificando de forma gradual, Abdullah diz que o momento ainda não é de euforia. “Os números mostram que a recuperação desse segmento é muito mais lenta do que o turismo de lazer”, esclarece o responsável pelo pelouro do Turismo, em entrevista ao MzNews.
Sabe-se que o turismo foi duramente afectado pela crise causada pela Covid- 19. Que cenários o sector vive actualmente com esta quase retoma das actividades?
Sim é verdade, infelizmente estamos a falar de um caso singular de entre os vários sectores de actividade. O sector do Turismo é, de forma destacada, o sector mais afectado negativamente pelos efeitos desta pandemia.
Neste momento, ainda estamos com uma grande parte do sector a perceber de que forma pode reagir. Houve muitas empresas a encerrar enquanto muitas outras não encerraram, mas ficaram profundamente incapacitadas para iniciar uma recuperação pelos seus próprios meios. Essencialmente as empresas com mais meios, estrutura e fundamentalmente maior capacidade financeira estão-se a adaptar melhor e a procurar reagir.
Temos procurado ao nível do trabalho feito no Pelouro de Turismo da CTA explorar os canais de comunicação que temos com o nosso Governo, buscando soluções em conjunto entre sectores privado e público, porque as necessidades para a retoma de um sector como o do Turismo não serão resolvidas sem este trabalho em equipa. Essa é uma certeza que temos e uma das linhas mestras que pautam toda a nossa estratégia para a recuperação do sector.
O Turismo em Moçambique é um Turismo de negócios e os números mostram que a recuperação desse segmento é muito mais lenta do que o Turismo de lazer.”
Este contexto permite-nos dividir a situação em dois cenários diferentes: o das empresas que estavam mais preparadas e por isso com os seus próprios meios estão neste momento sozinhas a puxar pelo sector, liderando esta recuperação; e depois, o da maioria das empresas que está na expectativa para perceber que ajuda lhes pode ser concedida do lado do nosso Governo porque não têm capacidade para fazer esse difícil caminho da recuperação sozinhas.
No entanto, como já tive oportunidade de frisar, temos consciência que nada se irá resolver apenas com disponibilização de fundos ou isenção de impostos por exemplo. O Turismo em Moçambique é um Turismo de negócios e os números mostram que a recuperação desse segmento é muito mais lenta do que o Turismo de lazer por exemplo, e por isso temos de concentrar esforços em reenquadrar a nossa oferta e o nosso foco em termos do tipo de produto que promovemos e privilegiamos enquanto País. Falo em aproveitar esta oportunidade para de uma vez por todas darmos ao nosso produto turístico nacional o apoio e as ferramentas que precisa para se assumir como actor principal do Turismo de Moçambique.
Essa é a única forma de fortalecer as economias locais, melhorar as infraestruturas e criarmos formas de capitalizarmos todo o potencial que temos no País, não ficando tão expostos ao turismo que pode ou não vir de fora.
Que números se pode avançar em termos de receita e de actividade produtiva neste momento?
Neste momento, ainda é difícil indicar cenários concretos em termos de recuperação da actividade produtiva ao nível do sector no geral.
Podemos, até certo ponto, considerar os números que já temos do lado da Aviação como indicativos de alguma recuperação, já que aí estamos com valores perto dos 75% de volume pré-pandemia. No entanto, apesar de poder indiciar algum padrão de recuperação, sabemos que estes números não reflectem a mesma dinâmica de recuperação do sector no geral, que não ultrapassará seguramente os 50%.
No sector do turismo, quais são as áreas que se têm destacado nessa retoma?
A Aviação é de facto a indústria ligada ao sector que mais rapidamente está a aproximar-se dos volumes pré-pandemia.
No entanto, e apenas para enquadrar esta evolução no contexto daquilo que foi a crise em que a indústria da Aviação mergulhou como resultado directo da pandemia, só ao nível de companhias aéreas europeias estamos a falar em perdas superiores a 22 biliões de euros com os aeroportos a sofrerem uma redução de quase 75% em termos de fluxos diários.
A Aviação é de facto a indústria ligada ao sector que mais rapidamente está a aproximar-se dos volumes pré-pandemia. “
É muito importante e muito urgente prepararmo-nos também para isto, para entender corretamente estes números e indicadores da recuperação que todos desejamos que aconteça. As perdas foram imensas e infelizmente, com a expectativa de estagnação ao nível do crescimento económico, o aumento dos custos com os novos protocolos de segurança e as constantes mudanças nas restrições de viagens, a recuperação real e efectiva demorará muitos anos a chegar.
Que medidas podem ser tomadas para que o sector volte ao seu estágio normal em termos de receitas?
Neste momento, o principal desafio para o nosso Turismo é assumir definitivamente que a aposta no Turismo Doméstico é séria e para manter.
No entanto, e em paralelo, no Pelouro do Turismo estamos a trabalhar em algumas medidas que são essenciais para o nosso sector e que, por essa razão, não descansaremos enquanto não forem uma realidade:
a implementação de modelos de desenvolvimento sustentável para o Turismo, integrando as comunidades e promovendo as economias locais, envolvendo não só as empresas e empresários da região como melhorando as infraestruturas para usufruto directo pelo público em geral;
a melhoraria da reputação dos destinos e do País no geral em termos de segurança e protecção, recuperando a confiança de turistas e potenciais investidores;
a formação e capacitação das lideranças locais na implementação dos planos nacionais de valorização de produto turístico nacional a adopção de standards de qualidade de serviço e automatização de processos através do recurso à tecnologia.
Estas são algumas das medidas essenciais, não só para voltarmos ao nosso estágio normal, mas para o superarmos e atingirmos um desenvolvimento que nos permita ter um sector capaz, estável e sustentado.
Que perspectivas se antevê no futuro, para o turismo?
Em casa, o meu pai ensinou-nos a ter fé, acreditar em Deus, ter esperança e nunca desistir, continuar a trabalhar muito porque, se Deus quiser, seremos recompensados. Também por isso, sou muito optimista em relação ao futuro do nosso Turismo, temos sem dúvida uma enorme jornada pela frente, mas fui habituado a encarar problemas como oportunidades e não consigo deixar de ver o nosso contexto actual de outra forma diferente. É a oportunidade que temos de estruturar e projetar para o futuro um sector que pode ser um dos motores mais importantes da nossa Economia.
Moçambique é dos poucos países com estas condições e recursos naturais em todo o Mundo cujo desenvolvimento e exploração por parte do País ainda não se deu. Estamos a falar de 2,5 mil kms de potencial turístico em estado puro, praias paradisíacas, ilhas desertas, mar cristalino, fauna e flora únicas, excelente gastronomia, povo quente e acolhedor. Não consigo não estar optimista e não imagino outra forma de encarar o futuro.
Tenho a certeza de que todos nós, moçambicanos, amantes da nossa Pátria, saberemos reconhecer e aproveitar as maravilhas do seu País, contribuindo directa e decisivamente para o desenvolvimento da nossa economia.