“Moçambique dificilmente se tornará um Estado forte, enquanto não haver separação de poderes”

“Moçambique dificilmente se tornará um Estado forte, enquanto não haver separação de poderes”

O economista e antigo presidente da Autoridade Tributária de Moçambique (AT) e e do Instituto Nacional de Estatística (INE), Rosário Fernandes, afirma que Moçambique dificilmente se tornará um Estado forte, enquanto não haver respeito pelo princípio de separação de poderes e nalgum momento, se confunde o campo da actuação do Estado e de um partido político.

Falando na última quinta-feira (25), durante a aula inaugural na Universidade Pedagógica- Maputo, Rosário Fernandes diz que não se explica que servidores públicos ocupem horas normais de expedientes, dentro das instalações públicas, em reuniões políticas partidárias.

“Os servidores que ocupam horas de trabalho a fazer reuniões de partido, não estão a contribuir para o Estado, não estão a trabalhar e, um dirigente ético e improbo devia os marcar faltas e descontar essas ausências no salários. Isso não é nenhuma anormalidade. É seguir os ditames da lei”, disse o palestrante.

Citado pelo Media Fax, Rosário Fernandes recorda que, através da lei número 16/2012 de 14 de Agosto, Moçambique aprovou a lei de Probidade Pública, que é um instrumento legal que exige a probidade e respeito da ética no seio da administração pública.

O antigo dirigente destaca ainda que esta lei sistematiza de forma clara as normas que consagram os deveres, responsabilidades e as obrigações dos servidores públicos a fim de assegurar a moralidade, a transparência, a imparcialidade e a probidade pública.

“Este instrumento abrange todos titulares de órgãos públicos, partindo do Presidente da República até ao chefe da povoação sem ignorar gestores de outros entes do Estado”, realçou Fernandes.

Para velar pelo cumprimento da ética, segundo o palestrante, foi criada a Comissão Central de Ética Pública, que é composta por nove membros designados pelo Governo, Assembleia da República e pela magistratura judicial.

Contudo, na violação dos princípios éticos da parte dos titulares de órgãos públicos, nalgumas circunstâncias com sinais de crime, esta Comissão não se faz sentir. Também não se faz sentir a acção dos órgãos de fiscalização da legalidade, como é o caso da Procuradoria-geral da República e do Tribunal Administrativo.

De acordo com Rosário Fernandes, a lei de Probidade Pública proíbe, por exemplo, o uso do local e a hora de trabalho para realizar trabalhos alheios como reuniões de partidos políticos, assim como o uso de bens e equipamentos das instituições públicas para fins privados.

Entretanto, no terreno são incontáveis os casos em que residências protocolares servem para alojar membros do partidos políticos com a logística e o pessoal de apoio suportado pelo Estado.

Para Rosário, a inoperância da Comissão da Ética Pública resulta em parte da forma como é constituída.

Explica que as Comissões de éticas deviam se inspirar nas comissões eleitorais com as devidas adaptações regimentais em boa praxe da eticalização das instituições públicas. Para tal, os integrantes da Ética Pública, deviam ser indicados por sufrágio onde para além de parlamentares, participam, instituições académicas, religiosas, organizações da sociedades civil e partidos políticos extraparlamentares.

Para tal, a proposta dos candidatos não devia vir do Parlamento ou do Governo, mas das forças vivas da sociedade moçambicana como é o caso das instituições académicas, religiosas ou da sociedade civil.  Isto é, figuras que não têm interesse directo no que vão orientar, deliberar ou responder.

A assim evita-se a teoria das maiorias parlamentares simples ou absolutas ou de voto discricionário assim como acções de pressão, influência, manipulação ou intimidação dos seus membros de quem nas actuais disposições têm a incumbência de nomear, transferir, punir ou demitir quantas vezes sobre critérios obscuros e de acordo com os seus interesses.

Devido a estas e outras tantas fragilidades, assiste-se no País cenários em que o requisito para alcançar o alto cargo na administração pública ou na gestão das empresas públicas não é a competência para ocupar o cargo, mas o simples facto de ser camarada.

Bens e negócios de Estado estão a ser apoderados por minorias de grupos pertencentes a certos partidos políticos.

“É difícil desenvolver um Estado num cenário em que, cada vez que um grupo chega, diz que é a minha vez, e, se você quer um lugar na hierarquia, me favorece nisto e naquilo. Dê-me, que te dou. Hoje, as vagas que deviam ser ocupadas através de concurso público são preenchidas através de nepotismo, favores e filiação partidária. É muito difícil construir um país de justiça social neste termos”, lamentou.

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