O Centro de Integridade Pública (CIP) publicou um relatório onde, entre outros, revela os nomes das empresas, internacionais e nacionais, líderes de mercado no negócio milionário da distribuição gratuita de material escolar, em Moçambique. O documento indica igualmente os valores específicos que cada uma delas arrecadou a cada concurso lançado pelo Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH).
O negócio da provisão gratuita de material escolar para escolas primárias moçambicanas faz circular, entre editoras e gráficas, mais de 1,4 mil milhões de meticais (23 milhões de dólares, no câmbio actual – USD 1=64.46 Mzn). Os parceiros de cooperação canalizam o valor ao Fundo de Apoio ao Sector de Educação (FASE), a quem cabe a gestão. Há quase duas décadas, de 2003 a 2022, todos os anos 30% dos reais beneficiários fica sem acesso ao material escolar.
De acordo com o CIP, esse tempo parece não ter sido suficiente para gráficas nacionais liderarem o negócio da impressão de manuais, pela falta de capital e inexistência de uma forte e competitiva indústria editorial e gráfica, que possa responder à demanda.
A “bolada” para o fornecimento de livros escolares é feita através de concursos públicos internacionais, diz o CIP. As empresas vencedoras têm sido de Portugal e Inglaterra – as colossais –, e da Índia, Vietname, Coreia do Sul, Malásia e Espanha. “Os livros são produzidos, editados e impressos, fora do país”.
“[As] grandes companhias internacionais não encontram concorrência no mercado local, em termos de qualidade ou preço, tendo poucas editoras moçambicanas ganho concursos do MINEDH para fornecimento de manuais escolares”, lê-se.
O CIP diz que o negócio do livro escolar em Moçambique é liderado por três grupos de empresas.
O primeiro compreende a Plural Editores, do grupo Porto Editora, Texto Editora, do grupo Leya e a Pearson/Longman, que “[há vários anos] controla grande parte do mercado do livro escolar, possuindo direitos editoriais sobre vários títulos de livros em Moçambique, incluindo manuais do ensino secundário”.
Só para o fornecimento de livros da 4ª classe, em 2019, a Porto Editora facturou pouco mais de 147 milhões de meticais (dois milhões de euros – EUR 1 = 73.63) e a Texto Editora arrecadou perto de 49 milhões de meticais (670 mil euros).
Estas são empresas que participam de vários outros concursos públicos lançados pelo MINEDH para edição e impressão de manuais escolares do ensino primário, de acordo com a nossa fonte.
O segundo grupo é constituído, maioritariamente, por empresas asiáticas (Índia e Vietname), que fazem a reimpressão dos materiais escolares do ensino primário.
Só em 2016, a indiana Seshaasai Business Forms Pvt Ltd, facturou 83.7 milhões de meticais (1.3 milhão de dólares norte americanos) com dois concursos adjudicados pelo MINEDH.
“Igualmente a Burda Druck Pvt, Ltd, detida pela gigante alemã Hubert Burda Media, presente em países como Alemanha e França, ganhou 2 concursos orçados em 1 milhão de dólares norte americanos, equivalente a 64.46 milhões de meticais”, revela o CIP.
Entre estas destaca-se também a indiana Lovely Offset Printers Pvt Ltd que facturou, no mesmo ano, cerca de nove milhões de meticais (140 mil dólares) com adjudicações do MINEDH.
As empresa moçambicanas aparecem no terceiro grupo. Estas ficam com o bolo concernente à produção de manuais em línguas locais, no quadro do ensino bilíngue. Lá estão empresas como a Alcance Editora e algumas gráficas, entre as quais a BDQ e a Académica, facturando na moeda mais fraca, o Metical.
No seu conjunto essas empresas moçambicanas, que têm pouca experiência a área, são menos expressivas, “possuindo a menor quota no mercado dos concursos públicos do MINEDH tanto para a edição como para a reimpressão dos manuais”.
“A BDQ, Impressão e Gráfica, Limitada facturou 56,2 milhões de meticais com a adjudicação de 3 dos 4 lotes de um concurso do MINEDH para a impressão de manuais da 1ª e 2ª classes. A Alcance Editores, Limitada arrecadou 27,3 milhões de meticais num contrato para produção de manuais da 1ª e 2ª classes para o ensino bilíngue. E por fim, a Académica, Limitada encaixou 18 milhões de Meticais com a adjudicação de 1 dos quatro lotes do concurso do MINEDH para a impressão de manuais da 1ª e 2ª classes”, detalha o relatório.
“Ao longo de quase duas décadas não se investiu na indústria editorial e gráfica nacional de modo que empresas deste ramo pudessem ombrear com suas congéneres internacionais. O resultado é visível. As editoras e gráficas nacionais continuam no limbo do lucrativo negócio do livro escolar”, conclui a análise.
Apesar disto, o CIP recorda que a contratação pública em Moçambique é um dos maiores fossos para ocorrência de actos de corrupção no país. No seu entender, para esse serviço no sector da educação o cenário parece sedutor por envolver muito dinheiro. Daí que alerta para o envolvimento da sociedade civil no escrutínio das empresas, uma vez que o facto de o processo ser monitorado pelo Banco Mundial (BM) ano garante ausência de corrupção, nas suas variadas formas, como acontece em outros países da África-Subsaariana, assistidos pelo BM.
Source: CIP