O jurista, antigo governante e vice-presidente da Assembleia da República, Abdul Carimo Issá, considera que a partir do momento que se politizou a Comissão Nacional de Eleições (CNE), o processo eleitoral no país se tornou problemático.
Falando numa entrevista à RDP África sobre as irregularidades nos processos eleitorais e da actual situação que se vive em Moçambique, caracterizada por protestos desde o anúncio dos resultados eleitorais em Outubro pela CNE, o antigo governante entende que “a lei eleitoral moçambicana não é boa, pois só favorece quem está no poder”.
“Tínhamos que ter uma lei mais imparcial, e não acredito que por via do Parlamento consigamos ter uma lei com esta natureza. Esta lei tem de vir da sociedade civil ou talvez com o apoio de organizações internacionais. Portanto, o processo eleitoral em Moçambique está viciado em inúmeras irregularidades”, afirmou o jurista.
Segundo Abdul Carimo Issá, Moçambique já deveria ter ganho maturidade suficiente para que as coisas fossem feitas com transparência e integridade por forma a prestigiar não só o país, mas também os órgãos de administração eleitoral e da justiça.
“Infelizmente, desde 1994 a esta parte, o que temos vindo a assistir é cada vez uma degradação dos processos eleitorais. Uma degradação na credibilidade dos processos e descrédito que leva a que hoje, portanto, grande parte das pessoas optar por não votar, porque votar ou não, dá tudo na mesma. Portanto, isso significa o grande descrédito que tomou conta das pessoas”, lamentou Issá.
Abdul Carimo Issá esteve envolvido nas primeiras eleições multipartidárias onde teve a tarefa juntamente com uma equipa de ir visitar os processos eleitorais nos países com uma situação semelhante à de Moçambique que acabava de sair de uma guerra. Por isso, lembra que o primeiro processo eleitoral ocorreu de forma pacífica.
“Mais tarde, o processo foi evoluindo e foi-se tornando cada vez mais sofisticado. Com o apuramento a nível das mesas, depois de um apuramento a nível distrital, provincial e nacional, foram se introduzindo pacotes informáticos. Tudo isto levou a que fraudes pudessem ser feitas com muita frequência”, assinalou o jurista, acrescentando que “o processo fraudulento em Moçambique começa no acto do recenseamento eleitoral”.
“Ou porque nem todo cidadão moçambicano é recenseado, ou porque as máquinas que são enviadas para um determinado local não funcionam, estão avariadas constantemente e as pessoas não conseguem se recensear. Ou porque não são admissíveis determinados documentos, portanto, todos esses problemas começam no acto de recenseamento. E depois com a publicação dos cadernos eleitorais que nunca são publicados, e os que existem estão nas Mesas das Assembleias de Voto. Portanto, esta é a primeira fase da fraude”, prosseguiu.
Adicionalmente, o antigo governante diz não fazer sentido que a CNE invoque falta de tempo para analisar a discrepância nos números e avance para anunciar os resultados eleitorais, deixando o trabalho para o Conselho Constitucional.
“É absurdo. Quando uma CNE que invoca este prazo para fazer o que fez, mas se esquece que em muitas mesas de voto não foram abertas na hora que estava marcada. Portanto, para isto não há lei a cumprir?”, questionou, concluindo que a actual situação que Moçambique vive não é o problema dos resultados eleitorais, “é o somatório de vários outros problemas que afecta os moçambicanos, entre eles a corrupção e pobreza”.
(Foto DR)
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