A troca de dívida da EMATUM por Eurobonds foi uma manobra para esconder verdades do público e do FMI, tendo resultado num agravamento da dívida de 500 milhões de dólares para 721 milhões e, posteriormente, para 900 milhões, refere o Fórum de Monitoria ao Orçamento (FMO), que cita a acusação da justiça americana contra o antigo ministro das Finanças Manuel Chang.
Segundo o FMO, “essa operação, que foi inicialmente apresentada pelo Governo de Moçambique como uma solução de reestruturação, em acusações do Governo americano, fica patente que tal reestruturação tinha o objectivo de esconder do público e do Fundo Monetário Internacional (FMI) a quase falência da estatal, bem como ocultar ainda mais o esquema fraudulento”.
Desde 2018, Moçambique tem desembolsado cerca de 45 milhões de dólares em juros anuais e deverá desembolsar 1,5 mil milhões de dólares até 2031, referentes ao capital e juros, refere-se numa nota divulgada pelo fórum, em alusão ao referido laudo acusatório, citado pelo jornal Savana.
O documento sublinha ainda que “o Governo, aparentemente, ignorou uma oportunidade de um alívio de 200 milhões de dólares dessa dívida”.
Adicionalmente, de acordo com o FMO, o que inicialmente foi apresentado como uma solução para reestruturar a dívida da EMATUM, e que colocou um fardo mais elevado sobre as contas do Estado, é apresentado pela acusação da justiça norte-americana contra Manuel Chang e co-conspiradores como uma manobra do esquema fraudulento.
De acordo com a acusação contra Manuel Chang, em curso no tribunal de Nova Iorque, os co-conspiradores propuseram a troca de notas de participação dos empréstimos da EMATUM por eurobonds para ocultar do público e do FMI a quase falência das empresas do projecto.
A operação permitiu estrategicamente prolongar a data de vencimento da dívida da EMATUM, ocultando ainda mais a fraude apresentada pela acusação.
Sob pressão dos inquéritos do FMI sobre o uso dos recursos do empréstimo por Moçambique, a acusação aponta que os co-conspiradores, incluindo banqueiros do Credit Suisse, prepararam documentos enganosos para convencer investidores, incluindo dos Estados Unidos, a participar na operação de troca por eurobonds.
Para a acusação, os documentos continham informações falsas sobre o destino dos empréstimos da EMATUM, os rendimentos esperados, as datas de vencimento e os riscos de corrupção e branqueamento de capitais associados ao projecto, levando a percepções irrealistas sobre as euro-obrigações. “Essas falsas declarações e omissões eram materiais para a decisão dos investidores, e constituem a base da acusação de fraude”, lê-se ainda na acusação.
Não obstante, a mesma acusação acrescenta que os conspiradores se aproveitaram da confiança dos investidores no sistema financeiro americano, na medida em que alguns viajaram para Nova Iorque para convencer os investidores americanos fisicamente, e as transferências electrónicas de fundos dos investidores foram processadas mediante contas do Credit Suisse em Nova Iorque, portanto, utilizando o sistema financeiro dos EUA.
A acusação detalha que após o anúncio da troca em Março de 2016, não houve cumprimento dos pagamentos de financiamento até Janeiro de 2017, indicando uma incapacidade ou falta de intenção em reembolsar os investidores. Especificamente em relação a Manuel Chang, a acusação mostra e-mails e folhas de cálculo indicando que a Privinvest fez pagamentos de suborno e propinas a Chang e outros envolvidos. Chang argumenta que, tendo deixado o cargo em 2015, não teve envolvimento directo na troca dos eurobonds em 2016.
“Apesar de Chang não estar directamente envolvido na troca dos eurobonds, o juiz considerou que a continuidade entre o financiamento dos projectos marítimos e a subsequente reestruturação de títulos não constitui conspirações separadas”, refere-se.
A troca de títulos por obrigações em euro levou a significativas perdas financeiras que poderiam ser usadas em sectores-chave da economia e compromete significativamente o espaço fiscal futuro até 2031, em prejuízo para os investimentos sociais e económicos que poderiam ser realizados, sublinha o FMO.
Cronologicamente, a EMATUM não conseguiu cumprir os seus compromissos financeiros junto aos credores, dos quais 500 milhões de dólares devidos ao Credit Suisse.
O Governo de Moçambique assessorado pela LAZARD, assumiu a responsabilidade pela dívida e respectivos juros, ignorando diversos alertas feitos pelo FMO.
O Estado moçambicano alegou falta de capacidade e prosseguiu com a primeira reestruturação em 2016, que alargou o período de pagamento e elevou o valor dos títulos para 726,52 milhões de dólares. Três anos depois, em 2019, o Executivo moçambicano optou por outra reestruturação, denominada MOZAM 2032, elevando o valor da dívida para 900 milhões de dólares, acarretando custos de cerca de 40 milhões de dólares em taxas de consentimento e pagamento por troca.
(Foto DR)
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