Um centro de investigação sediado em Washington apela aos doadores internacionais para que financiem directamente as organizações humanitárias africanas, que estão severamente subfinanciadas, apesar de serem as que respondem melhor e mais depressa às crises no continente.
Num relatório que será apresentado na próxima quarta-feira, o Centro para os Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, na sigla em inglês) faz um ponto de situação do processo de localização da acção humanitária em África, ou seja, o esforço para transferir o controlo, o poder de decisão e os recursos da ajuda humanitária para actores locais e nacionais no continente, permitindo que sejam os membros das comunidades a liderar os programas e os serviços de que necessitam.
Segundo o relatório citado pela Lusa, o actual movimento de localização ganhou força na cimeira humanitária mundial de 2016, quando o então secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu que a acção humanitária fosse “tão local quanto possível, tão internacional quanto necessário”.
Nessa altura, representantes de 18 países doadores e 16 organizações de ajuda humanitária comprometeram-se a alocar directamente pelo menos 25% do seu financiamento humanitário a atores locais e nacionais até 2020.
No entanto, em 2020, a percentagem do financiamento atribuído a organizações locais e nacionais permanecia nos mesmos 3,1% que em 2016, recorda o relatório.
Actualmente, o envolvimento humanitário em África é motivado por eventos como conflitos, epidemias e desastres naturais.
As organizações provinciais, municipais e locais são normalmente as primeiras a responder às crises e têm muitas vezes acesso a áreas que são difíceis para as organizações internacionais logo após a crise deflagrar.
A sua presença junto das comunidades antes, durante e após as crises permite-lhes fornecer serviços básicos, mobilizar recursos e construir uma resiliência de longo prazo.
Mas, embora às vezes recebam apoio de actores internacionais e nacionais, são frequentemente excluídas e ignoradas nos sistemas construídos pelos atores internacionais e organizações multilaterais, lamentam os autores do relatório.
“As vozes africanas são excluídas do cenário de tomada de decisão — nas discussões dos doadores e nos próprios esforços de localização (…). A conversa sobre localização na África não pode limitar-se ao continente africano; deve ocorrer nas capitais dos doadores, com vozes africanas a liderar o diálogo”, pode ler-se no documento.
Por isso, a CSIS defende que os doadores devem aumentar a alocação de financiamento directo a organizações africanas para aumentar e sustentar as capacidades existentes e ajudá-las a tornarem-se independentes de organizações intermediárias com agendas próprias.
Para isso, os doadores devem criar linhas de financiamento mais pequenas, com processos de candidatura simplificados, para permitir às organizações da sociedade civil africanas concorrerem a apoio institucional directo.
As organizações internacionais devem aumentar a representação de organizações africanas, nacionais e locais, activistas, associações da sociedade civil e cientistas, que têm uma sólida compreensão da dinâmica e dos motores da dinâmica das crises.
“Esses atores devem ser representados proporcionalmente em todos os fóruns pertinentes, desde a liderança em campo até aos conselhos de administração na sede”, sugerem os autores do relatório.
As organizações locais e nacionais africanas “devem ser tratadas como parceiras, não como representantes ou fontes de informação a serem reaproveitadas na estratégia das organizações internacionais sem o devido crédito”.
“A natureza da localização no contexto da globalização é tal que ninguém, rico ou pobre, detém todas as chaves para os desafios do mundo. Das mudanças climáticas às pandemias e aos conflitos armados, as organizações africanas são parte da solução. As vozes africanas não podem ser ignoradas, devem ser elevadas”, conclui o relatório.
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