O Parlamento português discute na quinta-feira a possibilidade de alargar a adopção de crianças até aos 18 anos, além de outras alterações ao processo de adopção, com a apreciação de projectos de lei de quase todos os partidos da oposição.
Bloco de Esquerda (BE), Partido Comunista (PCP), partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), Livre e Iniciativa Liberal (IL) apresentam projetos de lei para que seja aumentada para 18 anos a idade até à qual uma criança pode ser adoptada, e que actualmente é de 15 anos.
No seu projecto de lei, o BE lembra que o limite de idade imposto pela lei “fundamenta-se, essencialmente, na anacrónica e desumana ideia de que se a criança tiver mais de 15 anos, será mais difícil a criação de laços semelhantes à filiação. Isto significa que, na óptica do legislador, a criança com mais de 15 anos não consegue amar, vincular-se e criar laços, pelo que ‘não merece’ ser adoptada e ter uma família”.
“Por outro lado, a lei parte do pressuposto de que nenhum cidadão ou cidadã está disponível para adoptar uma criança com mais de 15 anos, o que não se pode aceitar”, refere o partido.
Acrescenta também que esta “limitação” tem feito com que as crianças entre os 16 e 18 anos que foram confiadas para adopção fiquem num “limbo”, uma vez que não são adoptáveis, mas também ainda não são maiores de idade, “condenando-as à institucionalização”.
O Partido Comunista salienta, por outro lado, que aos olhos da Convenção dos Direitos das Crianças, bem como da lei portuguesa, todas as pessoas com menos de 18 anos são consideradas crianças.
Destaca que na lei da adopção apenas é contemplada uma excepção, que aceita a adoção de menores até aos 18 anos se estes não forem financeiramente independentes e se forem “filhos do cônjuge do adoptante” ou tiverem sido “confiados aos adoptantes antes dos 15 anos”.
“Esta situação discrimina crianças, jovens que têm direito a ser adoptados e que ficam impossibilitados pela lei de o ser, ficando condenados, a partir dos seus 15 anos, à institucionalização. Penalizam-se assim aqueles que mais deveriam ser protegidos, desrespeitando os direitos da criança”, critica o PCP.
Aponta ainda que, no limite, a actual lei permite que dois irmãos possam ser separados se, no momento da adopção, um tiver 15 anos e o outro 16. “São conhecidos casos em que tal se verificou”, garante o partido.
A pretensão de aumentar a idade da criança passível de ser adoptada até aos 18 anos é acompanhada pelo PAN com o argumento de que do actual enquadramento legal “resulta uma clara injustiça”, que “discrimina e penaliza de forma incompreensível as crianças com 16 e 17 anos”.
Para a IL, 30 anos depois da fixação de 15 anos como a idade máxima da criança que pode ser adoptada, é altura de reflectir sobre a razão de ser dessa opção e “adaptar a lei a uma visão contemporânea do direito da família, que privilegie os direitos das crianças e dos jovens, uma vez que esta opção legislativa não encontra qualquer respaldo científico”.
O Livre, por seu lado, cita o Relatório de Caracterização Anual da Situação de Acolhimento das Crianças e Jovens (CASA) de 2021 que refere que “a maior exigência que se coloca ao sistema de acolhimento está em encontrar respostas para jovens com idades entre os 12 e os 17 anos”, que representam “um peso de 71% das situações de acolhimento”.
O partido apresenta também um projecto de lei para diminuir para 25 anos a idade mínima de quem pode adoptar, que estas pessoas possam viver em união de facto e que a criança possa dar o seu consentimento à adopção a partir dos oito anos e não dos 12, como a actual lei define.
Na mesma altura, o Parlamento discute igualmente um outro projecto de lei do PCP, que chegou a ser apresentado na anterior legislatura, para que os jovens com mais de 18 anos, com medida de promoção e protecção, possam reentrar no sistema nos casos em que pedem para sair e depois se arrependem. Essa decisão é, até ao momento, irreversível.
Já o partido Chega leva um projecto de lei para alteração ao Código Civil, Regime Jurídico do Processo de Adopção e o Código do Trabalho, com vista a reduzir o número de crianças institucionalizadas e garantir um processo de adopção célere e bem-sucedido.
Os dados estatísticos mais recentes sobre adopção em Portugal, da responsabilidade do Instituto de Segurança Social e referentes a 31 de Dezembro de 2021, davam conta de 226 crianças em situação de adoptabilidade e 1.419 candidatos a adopção, o que dá uma relação de candidatos seis vezes superior ao número de crianças. Nesse ano foram adoptadas 125 crianças.
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