Uma cidadã moçambicana, natural do distrito de Muidumbe, na província de Cabo Delgado, partilhou a sua experiência de sofrimento e luta contra terrorismo, perante o Papa Francisco e mais de 200 mil pessoas que participam das 37ª Jornada Mundiais da Juventude, em Lisboa, Portugal.
Marta Luís, de 18 anos de idade, órfã de pai aos sete, contou que passava noites orando à Deus para que nada mal acontecesse a si e sua família.
“Na região norte, onde morávamos, ouvia falar dos ataques terroristas que aconteciam nas outras localidades perto do nosso distrito, mas não imaginávamos que também seríamos atacados. No dia 7 de Abril de 2021, pela manhã, os terroristas atacaram nossa aldeia. Fugimos com toda a família para o mato. Ficamos quatro doas escondidos”, disse citada pela Rádio Moçambique.
Elucidou que perante as incertezas de novos ataques a rotina passou a ser passar o dia nas casas e regressar ao mato nas noites. “Quando soubemos que os terroristas tinham saído voltamos para casa. Lá passávamos o dia e de noite, por medo, voltávamos a dormir no mato.”
Diante das novas circunstâncias e sem quase alguma alternativa, encontravam consolo em orações.
“Rezávamos muito, pedindo à Deus que nos livrasse de todo o mal e para que o Senhor nos desse a força para superar aquele momento de dificuldade. Não dormíamos a noite toda. Ficávamos a rezar Ave Maria, O Pai Nosso, pedindo ao senhor para que não acontecesse o pior nas casas das pessoas”, disse, sem conseguir disfarçar as emoções.
Ele disse ainda que apesar do ataque de 7 de Abril, a vida na aldeia continuou, contudo, a aldeia foi novamente atacada a 31 de Outubro de 2021.
“Este ataque foi maior. Fugimos novamente para o mato. Passámos muita fome. Os terroristas encontraram-nos no mato e dispararam para cima. Não fizeram nada com a nossa família, mas sentimos muito medo e saímos correndo. Com muitas dificuldades conseguimos chegar na província de Nampula onde fomos acolhidos por alguns familiares”, contou.
A 37ª Jornada Mundial da Juventude decorre em Lisboa, Portugal, desde 01 de Agosto e termina hoje, domingo. Durante este período juntou mais 1,5 milhões de peregrinos, entre ele 25 mil de vários países, incluindo cerca de 600 moçambicanos.
Leia abaixo do discurso completo:
“Chamo-me Marta, tenho 18 anos. Venho de Moçambique, da Província de Cabo Delgado, onde enfrentamos uma guerra que já dura há cinco anos. Sou do Distrito de Muidumbe numa região chamada Planalto do Povo Maconde. Participava da Paróquia Sagrado Coração de Jesus ou também conhecida como Missão de Nangololo. Venho de uma família simples e pobre. Cedo perdi meu pai, tinha apenas sete anos.
Depois que o meu pai morreu continuámos a nossa missão: minha mãe com as quatro filhas. Estudava na escola da comunidade e participava na vida da paróquia, onde era acólita e também participava nos encontros para ser crismada. Na região norte onde morávamos ouvíamos falar dos ataques terroristas que aconteciam nas outras localidades perto do nosso distrito, mas não imaginávamos que também iríamos ser atacados.
No dia 07 de abril de 2021, pela manhã, os terroristas atacaram nossa aldeia. Fugimos com toda a nossa família para o mato. Ficámos quatro dias escondidos. Quando soubemos que os terroristas tinham saído, voltámos para casa. Passávamos o dia em casa e à noite, por medo, voltávamos a dormir no mato.
Rezávamos muito pedindo a Deus que nos livrasse de todo mal, e para que o Senhor nos desse a força para superar aquele momento de dificuldade. Não dormíamos a noite toda, ficávamos a rezar Avé Maria e Pai Nosso, pedindo ao Senhor para que não acontecesse o pior nas casas das pessoas. Depois do ataque do mês de abril continuámos nossa vida na aldeia, mas no dia 31 de outubro de 2021 os terroristas voltaram atacar.
Este ataque foi muito grande. Fugimos de novo para o mato. Caminhámos muito sem saber o que fazer. Não tínhamos comida nem água. Passámos muita fome. Os terroristas encontraram-nos no mato e deram tiros para cima. Não fizeram nada com nossa família, mas sentimos muito medo e saímos correndo. Com muita dificuldade conseguimos chegar na Província de Nampula onde fomos acolhidos por alguns familiares. Quando estávamos no mato, rezávamos muito. Em nenhum momento perdemos nossa fé.
Pedia a Deus que nos ajudasse e tirasse toda maldade do mundo e que as pessoas que estavam provocando essa guerra mudassem de vida. As populações das nossas aldeias estão todas espalhadas. Temos sido acolhidos nas paróquias onde fomos morar, mas temos muitas saudades da nossa aldeia e dos nossos costumes, cantos e danças. Mas em meio a todo sofrimento numa perdemos a fé a esperança de que um dia vamos reconstruir de novo a nossa vida.” (Discurso extraído do portal da Rádio France International)
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