Os países com baixo nível de desenvolvimento devem optar por contrair “dívida boa” dadas necessidades de investimento nas suas já frágeis economias, de acordo com a Directora do Departamento de Estratégia, Política e Análise do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Ceyla Pazarbasioglu considerou que os principais entraves no desenvolvimento desses países foram, nos últimos tempos, a pandemia da covid-19, a guerra na Ucrânia e as alterações climáticas. Neste sentido a “dívida boa” – que se pretende avultada – deveria ser para “investimentos nas infra-estruturas”.
Além da “dívida boa”, deve-se garantir que as dívidas contraídas por empresas públicas e terminam como encargos nas contas do Estado devido às garantias governamentais, “sejam evitadas, precisamente para assegurar que o valor que é preciso para garantir investimento reprodutivo na economia seja realmente disponibilizado”, acrescentou Ceyla Pazarbasioglu.
A responsável falava, recentemente, num painel de debate organizado pelo FMI sobre o “Fortalecimento da Sustentabilidade da Dívida”.
O evento, que decorreu em formato virtual a partir de Washington, teve também a participação de vários economistas ligados à questão da dívida pública, entre eles o professor da Universidade de Harvard, Kenneth Rogoff, e o co-presidente do grupo de trabalho sobre este tema no Comité de Bretton Woods, John Lipsky.
Kenneth Rogoff reconhece o papel do sector privado no desenvolvimento das economias pobres, mas alega que o sector tem sido o maior problema do aumento da dívida pública nos últimos anos, tudo porque não tem incentivos para ajudar quando há uma crise.
“Não há qualquer incentivo para os privados participarem nas reestruturações de dívida quando elas são necessárias devido a um acontecimento particular ou a um conjunto de eventos que ditariam essa possibilidade”, disse o académico especialista em dívida pública, referindo-se especificamente à falta de participação do sector privado nas iniciativas de reestruturação da dívida lançadas pelo G20 e pelo Clube de Paris.
Em entrevista recente à Lusa, o director do departamento de “rating” soberano da Standard & Poor’s (S&P) já tinha alertado para o impacto da dívida pública no desenvolvimento dos países africanos.
“Já antes da pandemia estávamos a assistir a uma subida da dívida pública, embora agora haja mais opções de financiamento para os países africanos do que havia há 10 ou 15 anos: a China, as multilaterais, a emissão de títulos de dívida em moeda estrangeira (Eurobond), e a expansão dos mercados internos, por exemplo”, elencou Ravi Bathia.
Com a dívida a subir e a pressionar as finanças públicas, o controlo, segundo ele, estava no facto de o crescimento ser bastante forte na região, mas esta equação foi atingida pela covid-19, que de repente colapsou o crescimento de vários países, piorando as métricas da dívida.
“A dinâmica mudou e vários países entraram em ‘debt distress’ [níveis de dívida demasiado altos], a Zâmbia entrou em incumprimento financeiro, a Etiópia aderiu ao enquadramento comum para o tratamento da dívida, e agora estamos basicamente a ver a recuperação nas matérias-primas e no sector dos serviços, mas a questão da dívida está lá e causa problemas, com os países a procurarem soluções, como a reestruturação da dívida ou o aumento do acesso ao mercado, através de novos Eurobond para pagarem dívida de títulos antigos”, concluiu.