A crise instalada na família do ex-Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, é vista por dois conhecidos juristas angolanos, contactados pela VOA, como o resultado de uma “animosidade” por causa da falta de colaboração entre os filhos e a ex-Primeira Dama de Angola, Ana Paula dos Santos.
A ex-deputada angolana Tchizé dos Santos, filha do ex-Presidente de Angola, confirmou esta quarta-feira, 29, que os filhos contrataram uma advogada espanhola para, com base na justiça daquele país, tornar nula a relação matrimonial entre o casal.
Tchizé dos Santos alega que o facto de Ana Paula dos Santos não ter estado a viver com o pai na comunhão de mesa e de leito nos últimos anos retira-lhe o direito de continuar junto do marido, em Barcelona.
A filha do ex-Presidente rejeita também qualquer interferência do Estado e do Presidente João Lourenço nos assuntos inerentes à doença do seu pai, algo que o Governo angolano através do seu ministro das Relações Exteriores negou.
O jurista Lindo Bernardo Tito também entende que nesta matéria “é evitável que o Estado angolano interfira, por exemplo, na escolha da equipa médica, por ser uma questão de família no qual o Estado deve apenas apoiar a ajudar em tudo que for necessário.”
Bernardo Tito defende que a ex-Primeira Dama de Angola, Ana Paula dos Santos, não perdeu os direitos e deveres de esposa, com base no direito angolano por entender que a justiça espanhola não tem qualquer jurisdição sobre os actos praticados pelo Estado angolano.
Contudo, o jurista considera que o facto de Ana Paula dos Santos ter supostamente abandonado o marido por um período relativamente longo e o facto de nos passaportes o endereço do domicílio dos dois ser diferente, “é prova de que já não havia a comunhão de mesa entre ambos”.
“A relação entre as pessoas que se casam é uma relação diária que resulta na comunhão comum e na convivência. Quando esta relação se quebra é porque também se quebra o casamento do ponto de vista material e não podemos dizer que este casamento existe do ponto de vista formal quanto do ponto de vista material ele já não existe”, defende, Bernardo Tito.
O jurista admite que uma provável providência cautelar a ser intentada pela advogada contratada poderá resultar no regresso a Angola de Ana Paula dos Santos e do médico pessoal de José Eduardo dos Santos, deixando a situação sob o controlo dos filhos.
Entretanto, o também jurista Albano Pedro entende que uma eventual separação do casal só pode ser tomada por vontade pessoal de José Eduardo dos Santos ou sob seu mandato.
“Sendo um casamento que foi celebrado sem vícios e que está em vigor, mesmo que haja uma situação de separação de cama e mesa não são os filhos que devem intentar a acção a menos que seja o pai a manifestar claramente este desejo e, não estando física ou psicologicamente capaz para o fazer. Não basta que eles estejam separados de cama e mesa que é uma mera separação de facto. A separação jurídica tem que ser intentada”, afirma Pedro.
Para aquele jurista, “as pessoas podem ficar muitos anos sem viverem juntas e manter a relação de casamento formalizado”.
Albano Pedro acrescenta que o Estado “deve interferir” no estado de saúde do ex-Presidente angolano por força da protecção constitucional a que tem direito como membro do Conselho da República e gozar de protecção especial.
O jurista também alerta que “não poderá o Estado angolano manifestar vontade do Presidente junto ou da justiça espanhola ou dos hospitais ou serviços médicos que estão a cuidar do ex-estadista angolano” como, por exemplo, a transferência do doente ou a substituição da equipa médica.
Albano Pedro e Lindo Bernardo Tito consideram que a situação podia ser evitada se houvesse ponderação no tratamento do caso entre as partes envolventes e que uma disputa jurídica nesta fase “não contribui positivamente para a estabilidade emocional que José Eduardo dos Santos precisa para sair do estado de saúde em que se encontra”.
Tete António esclarece
Entretanto, o ministro das Relações Exteriores, Tete António, assegurou hoje que está em Barcelona “para se inteirar o do estado de saúde do ex-Presidente da República” e negou que estivesse mandatado para desligar as máquinas que garantem a assistência a José Eduardo dos Santos, conforme sugeriu Tchizé dos Santos.
“Nós somos africanos e temos uma cultura que não conduz a este tipo hipóteses”, disse o chefe da diplomacia angolana.
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