O Comité para a Protecção dos Jornalistas (CPJ) defende que o Presidente da República não deve promulgar alterações à legislação antiterrorismo sem pedir ao parlamento que altere a cláusula que pode criminalizar reportagens sobre terrorismo no norte do país.
Em 03 de Junho último, o projecto de emenda da legislação antiterrorista foi enviado pelo Parlamento a Filipe Nyusi para obter o seu parecer favorável, disse ao CPJ António Boene, presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais e Jurídicos da Assembleia Nacional, através de mensagens, citado no comunicado da organização.
O projecto de lei, já aprovado pelo parlamento em 19 de Maio, visa alterar a lei antiterrorismo de 2018 em Moçambique, incluindo uma cláusula que penalizará, com pena de prisão entre dois a oito anos, quem reproduza publicamente declarações falsas relacionadas com atos terroristas, segundo relatos dos média e um comunicado da secção moçambicana do grupo regional de liberdade de imprensa do Instituto para a Comunicação Social da África Austral (MISA) – Moçambique.
“O presidente moçambicano, Filipe Nyusi, não deve ratificar a emenda antiterrorista, mas sim devolvê-la à Assembleia Nacional para corrigir os defeitos e garantir que reportagens sobre a insurreição em Cabo Delgado não sejam criminalizadas ou censuradas”, disse Angela Quintal, coordenadora do programa África do CPJ, citada no comunicado.
“Os deputados já atenuaram outras cláusulas controversas do projecto de lei, mas o Presidente deve garantir que vão mais longe para proteger a liberdade de imprensa e o direito do público à informação, em vez de tentar controlar a narrativa na luta em curso contra o terrorismo em Moçambique”, acrescentou.
O Governo tem argumentado que as alterações são necessárias para reforçar o quadro jurídico do combate ao terrorismo, devido à insurgência e aos ataques terroristas em curso na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique, de acordo com relatos da agência noticiosa estatal moçambicana (AIM) e um documento do Governo, consultado pelo CPJ, que foi apresentado na Assembleia Nacional em Março de 2022, refere-se no comunicado.
Em 18 de Maio, o parlamento aprovou o projecto de alteração à lei antiterrorismo, afirmando que qualquer pessoa que divulgue intencionalmente informações sobre um ato terrorista, se souber que a informação é falsa, pode ser punida com prisão entre oito e 12 anos.
O MISA-Moçambique apelou, em 17 de Maio, ao parlamento para que alterasse essas cláusulas, defendendo que estas ameaçam a liberdade de imprensa.
Além disso, considerou que a criminalização da publicação de informações classificadas penalizava os jornalistas e os cidadãos comuns, e não os funcionários que não cumpriam o seu dever de proteger segredos de Estado.
A organização também se opôs à cláusula de informações falsas, argumentando que a sua redação era ambígua e tinha potencial para ser aplicada de forma arbitrária.
Na segunda leitura do projecto, em 19 de Maio, a Comissão de Assuntos Constitucionais e Jurídicos da Assembleia Nacional diluiu essas duas cláusulas, ao criminalizar a divulgação de informações confidenciais apenas por servidores públicos, e não por cidadãos em geral, e reduziu a pena de prisão para entre dois e oito anos por violação da cláusula de informações falsas.
O responsável pelo MISA-Moçambique, Ernesto Saúl, disse ao CPJ que, apesar dos esforços da Assembleia Nacional para alterar algumas das cláusulas, a lei proposta ainda pode prejudicar o exercício do jornalismo, principalmente punindo quem reproduz publicamente declarações sobre actos do terrorismo.
Emília Moiane, diretora do gabinete de informação do Governo moçambicano, por seu lado, considerou, em declarações por telefone ao CPJ, que não acredita que a lei proposta viole o direito à liberdade de imprensa, já que um dos princípios do jornalismo é publicar apenas a verdade.
“Acreditamos que os jornalistas seguem esse princípio. Terrorismo não é assunto para se falar sem certeza”, disse Moiane, que não adiantou quando o Presidente deverá analisar o projecto de lei.
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